18.12.06

A suposta democracia de poucos e o fascismo de contenção pra muitos

Ultimamente tenho vivido uma vidinha bem provinciana. De verdade. Fico aqui no mundusp e esqueço um pouco de como é o pega pra capar do centrão, só para citar o mais próximo, o que já vivi e já me machucou muito. Morei no centro, pertinho do minhocão logo que vim para São Paulo. De Piedade com todos os seus 70 mil habitantes para a merda generalizada. Difícil. Para ir ao banco pegar minha mesadinha apertada era terrível... voltava com vontade de pular pela janela de minha espaçosa e agradável kitnet, que me obrigava a fugir para o banheiro no caso de querer mudar de ambiente. E fugi. Foi isso mesmo. Sabia que com o tempo acabaria amortecendo algumas coisas para continuar vivendo.... mas não quis. Queria sair dali, e não me acostumar. Até porque até desencanar um pouco, eu já teria quatro úlceras e um cerébro derretido por entorpecentes. Não dava.
Bom...lembrei disso porque hoje, companheira Juju e eu, passando por baixo do minhocão, nos deparamos com um carro da guarda municipal zelando por um caminhão de água e sua mangueira super potente. Na hora não entendi. De repente, percebemos com um grito de indignação que os jatos de água era para expulsar a galera que mora naquelas rampas embaixo do viaduto. Um senhor fugia da fúria da pressão da água com algumas coisinhas debaixo do braço.
Isso, esses putos chamam de revitalização e higienização. Limpar para que prevaleça a democracia, o direito da classe média e alta de frequentarem o centro sem encontrar esses pobres feios e sujos que ousam morar na rua. Ou seja, até a rua é para poucos, dado que mesmo privados de tudo, do direito constitucional à moradia, nem lá essas PESSOAS podem morar, porque esteticamente é feio.
Para eles, o fascismo declarado. Para nós, o fascismo democrático.

11.12.06

Para tirar a amargura de foco

Sei que exagerei um pouco na última escrivinhada. Mas naquele momento, era isso mesmo. Pensei em apagá-lo, mas me veio a idéia de que não seria honesto com minha própria memória virtual. Dessa forma, resolvi trocar minha amargura, pela melancolia do belo Murilo Mendes. Cantei mal minha tristeza. Então passo a bola para o poeta.


O homem, a luta e a eternidade

Adivinho nos planos da consciência
dois arcanjos lutando com esferas e pensamentos
mundo de planetas em fogo
vertigem
desequilíbrio de forças,
matéria em convulsão ardendo pra se definir.
Ó alma que não conhece todas as suas possibilidades,
o mundo ainda é pequeno pra te encher.
Abala as colunas da realidade,
desperta os ritmos que estão dormindo.
À guerra! Olha os arcanjos se esfacelando!

Um dia a morte devolverá meu corpo,
minha cabeça devolverá meus pensamentos ruins
meus olhos verão a luz da perfeição
e não haverá mais tempo.

Murilo Mendes

7.12.06

O indivíduo no coletivo... ou como justificar a própria covardia.

Ao que remete a idéia de lealdade? Em um mundo no qual constantemente temos nossa subjetividade massacrada pelo fato de efetivamente estarmos inseridos em uma sociedade de massas, como construimos nossos valores? O que norteia a relação entre o indivíduo e o coletivo ?
Por muito tempo e por muitas vezes, me vi passando por cima dos meus preceitos, das minhas vontades, como forma de não magoar o outro. No entanto, suprimir o que temos de nosso também não caracteriza solidariedade nenhuma, não denota exatamente compaixão (não no sentido de piedade, mas de compartilhar os sentimentos) com a dor do outro, mas com a nossa mesma. Assumir determinadas posições e ser sincero é muito penoso, não afeta apenas o outro. Dessa forma, não ser sincero, significa poupar a nós mesmos da dor de causar o sofrimento no outro. Talvez nisso, esteja a deslealdade. Egoismo e não fraternidade de nos enxergarmos no outro. No fim das contas é mais fácil omitir e abrir mão da responsabilidade.
Por outro lado, temos sim influência direta sobre o bem estar do outro, e portanto temos que medir a forma como somos sinceros e leais. Caso contrário, a lógica do "se deus não existe, eu posso tudo" prevalece e em nome de uma suposta fidelidade, machucamos despropositadamente o outro, quando poderíamos ter sido mais delicados, mais sutis, evitar sofrimentos desnecessários. Qual o limite?
Não sei, de verdade. Mas hoje, me sentindo um pouco traída por pessoas que, querendo poupar o sofrimento (talvez mais o deles do que o meu) me omitiram problemas e verdades das quais eu gostaria de ter participado, mesmo que doesse. Acho que tentei ser leal, tentei fazer um exercício de sinceridade comigo e com os outros. Mas devo ter aparentado uma fragilidade tão grande (quando somos sinceros, nos expomos, e quando nos expomos, muitas vezes demonstramos nossas fraquezas) que deve ter parecido mais fácil me poupar de algumas coisas. Mas o sofrimento poupado, quando vem à tona, vem em dobro, porque traz um sensação de marido traído, uma sensação que remete a fidelidade, a um aspecto moral e não emocional das situações. Enfim, hoje estou preferindo que me contem tudo, doa o quanto doer. Porque as situações, as tristezas passam. Porém, a mágoa de que, naquela situação, pessoas me foram desleais fica. Hoje estou preferindo os trogloditas individualistas do que os falsos solidários. A verdade no lugar da omissão. Com os meus sentimentos, lido eu.

27.11.06

Sobre (ou sob) a vontade

A chuva, ao mesmo tempo que me deslumbra, dá uma sensação incrível de ser muito menor do que o mundo. A Aline está no meu colo, brigando para que eu não escreva porque ela quer carinho. Agora, escolhi desce-la porque não quero ser carinhosa, quero escrever. É sempre assim, quando quero puxar-lhe para junto de mim, recusa como se eu não a conhecesse, como se não a alimentasse todo dia. No entanto quando não a quero, alisa-me e fica dando cabeçadas pedindo que coloque minha mão sobre sua cabeça. Ela me lembra muitas outras situações em que fui incompatível com aqueles que tentaram gostar de mim. E também com aqueles de quem gostei. Nos desencontramos pela vida da mesma forma como eu e a gata Aline nos desencontramos pela casa. Acho que no fundo somos muito parecidas. Nós duas andamos procurando coisas nas horas erradas.
Está assustada com o trovão, deitou-se ao meu pé e desistiu. Minha vontade foi maior do que a dela, assim como por vezes, tenho a sensação de que uma vontade maior passa por cima da minha. Ela se resignou aos meus pés. E eu? Tenho me resignado diante de tantas coisas que vez ou outra tenho que me lembrar do que gosto e do que vale a pena brigar. Agora a chuva me prostrou de tal forma que não tenho vontade de me mexer. Quando conseguir lembrar do que existe além da cortina de água, quem sabe eu dance debaixo dela só para lhe mostrar que posso. Assim como a Aline enxergou que pode me vencer se ficar quietinha e me deixar fazer as duas coisas ao mesmo tempo : alisá-la e escrever. Assim como percebo que posso continuar, mesmo com a tristeza que me acompanha. Essa tristeza que hora ou outra, só para variar, até se mostra contente. Lembra que posso não estar completamente satisfeita, estar frustrada, sem estar prostrada diante de tudo. Assim como a Alininha, por meio da resignação, conseguiu contentar-se até sair dela e passar a ter um espaço definitivo. No meu pé, é fato. Mas ela pode ficar aqui até quando ela ou eu quisermos. Na resignação ela entendeu que a partir de um certo limite, do meu limite, a escolha passa a ser dela, não minha. Assim como daqui a pouco, essa tristeza que por enquanto faz com que eu desista, faça com que eu escolha, com que me sobreponha a simples vontade aparentemente imposta por uma mundo que não é fácil de ser vivido . Um pouco confuso? Pois é, no fundo só quero dizer que tudo uma hora cansa, até a tristeza, e que então chega a hora de lembrar das vontades e escolher para onde ir. A Aline também se cansou de ficar aos meus pés pedindo carinho, teve saudades do Che e foi buscá-lo. Para depois vir me chamar e dizer que ele estava preso no telhado do vizinho. Ela foi buscar o que lhe parecia melhor. E eu sai na chuva para ajudar o Che a sair de uma situação da qual, apesar de ter buscado sozinho, não conseguia sair. Aliás, sairia sim, mas demoraria mais. E para que sofrer mais do que o pedagógico se eu posso ir até lá ajudá-lo? Se ele tem a Aline que não o deixa nunca? Se tenho pessoas que também sairiam na chuva para me salvar.
Daqui a pouquinho, eu escolho.

21.11.06

Mais uma de Piedade....Tudo bem...

Só pela nostalgia despertada em responder insesantemente a mesma pergunta vinda de pessoas que realmente não se importam com a resposta... Salve a punkisse!

Oi, tudo bem?
Tudo bem, fora o tédio que me consome todas 24hs do dia
Fora a decepção do ontem, a decepção do hoje,e a desesperança crônica do amanhã !!!
Tenho vontade de chorar, raiva de não poder quero gritar até ficar rouco, quero gritar até ficar louco !!
Isso sem contar a ânsia de vômito,reação a tal pergunta idiota !!!!!
Fora tudo isso, tudo bem...

14.11.06

Ausência

Por muito tempo, ouvia teu nome e tudo latejava, perdia o sentido, estremecia... tristeza de saber pelos outros, de ter notícias longe de mim, sem que você me contasse, e muito menos que eu participasse. O estomâgo doia, a cabeça bagunçava e, chorona que sou, me debulhava em perguntas, nos porquês que nunca seriam respondidos, mas cuja solução é bem simples: Sente-se ou não amor, e na ausência desse, não há o que fazer, nem pelo que lutar. Pior para quem não entendeu, insistiu e sofreu. Pior para quem amou sozinha por tanto tempo. Para quem teve sua dor como companheira...
Mas depois de tempos, quando o nome volta aos ouvidos por uma dessas coincidências da má distribuição de renda, vem o alívio de não doer. Não disse não sentir, porque fará parte da memória. Mas não dói, não lateja, só faz parte de mim. E fará sempre.

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

C.D.A

8.11.06

Único diálogo possível - O molotov

Solidariedade para com a Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca. Para com aqueles que escondem o rosto para serem vistos. Nem que para isso tenham que queimar um Burguer King com molotov.


«Venimos a preguntarle a la patria, a nuestra patria, ¿por qué nos dejó ahí tantos y tantos años? ¿Por qué nos dejó ahí con tantas muertes? Y queremos preguntarle otra vez, a través de ustedes, ¿por qué es necesario matar y morir para que ustedes, y a través de ustedes, todo el mundo, escuchen a Ramona -que está aquí- decir cosas tan terribles como que las mujeres indígenas quieren vivir, quieren estudiar, quieren hospitales, quieren medicinas, quieren escuelas, quieren alimentos, quieren respeto, quieren justicia, quieren dignidad?»
Subcomandante Marcos

6.11.06

Quando estranhos personagens adentram a nossa vida

Maria Padilha. A pomba – gira. A puta que se fez Deusa. A vingança daquelas que esquecidas pelo mundo, mercantilizadas, apropriadas por mãos a quem não respondem com amor. Filhas da noite. Ditas perdidas pelo mundo machista que as execram. Ditas achadas por esse mesmo mundo que as procura.
O mundo cria sub-produtos. Crias renegadas que, no entanto, teimam em se manterem presentes e vivas. Teimam em lembrar ao mundo que existem. Teimam em ter voz. Quanto aos caminhos da redenção, não me compete julgar. Cada um vai como dá, faz suas escolhas como pode.
Hoje no banco, circulavam na minha frente sub-produtos não reconhecidos pelo mundo como tal. Moças bem pintadas, atinadas com a moda, ditas bem sucedidas e resolvidas. Aquelas as quais, Maria Padilha não chegaria nem perto. Elas talvez não procurem. Ou procurem da forma como estão acostumadas a lidar com o mundo. Vendendo e comprando. As imagino tentando se aproximar da deusa, por meio de plaquinhas que garantem a volta de seu amor mediante pagamento posterior. E fico imaginando a Maria Padilha, com um ar pedante e sarcástico:
- Para essas daí? Para elas não! Não são moças de casar? Não são dignas aos olhos dos homens? Não querem ser iguais para terem casamentos iguais? Sofrem? Problema delas. Para as minhas putas da noite, tudo. Para essas putas do dia, de carteira assinada, nada.
Eu gostaria que fosse assim. Bati boca com uma delas. A ferocidade com que, como uma leoa, defendia a instituição bancária, seu emprego medíocre, sua vida escondida pela maquiagem barata e mal feita, seus rancores por estar ali, me irritaram profundamente. Perdi o respeito por ela. Por todas as mocinhas que vieram lhe prestar auxílio com a mesma conversa de nós. Como se o Itaú admitisse um nós, além de seus acionistas. Pior que isso, só se ao invés de estar no banco, estivesse em alguma ong do Itaú social com bolachinhas e café. Desprezei a todas tão ferozmente quanto elas, do outro lado, defendiam o banco.
Sai de lá pensando no cara que me roubou. Prefiro ele. Ele foi mais educado. Ele falou manso e não me olhou de cima. Fez o que tinha que fazer. Olhou nos meus olhos. Elas não. Ele defendia o seu lado, elas defendiam o seu lado, defendendo o banco e anulando minha humanidade em nome de agiotas institucionalizados. Ladrão por ladrão, o cara que me assaltou foi mais digno porque não mandou recado. Fez ele. Não pagou mocinhas idiotizadas para fazer o serviço sujo. Fez ele.
Em meio a isso, passei então a pensar no quanto esse mundo pode, em uma virada de segundos, se transformar. Do plano completamente abstrato e virtual em coisa concreta, que se realiza de fato. O que antes era um limite de crédito, simples números, sem lastro correspondente, ou seja, dinheiro que não existia, se materializou ali na minha frente em muitas notas que seguiram para o outro lado do sistema bancário, com o sub-produto desse mesmo mundo fomentado por eles, pelos ladrões oficiais e rotineiros. A cria voltou buscar sua parte. Cobrar o abandono dos prmeiros anos. Exigir o que é seu.

(...) esta sociedade que compra tudo e tudo vende, hipocritamente condena os serviços daqueles que são usados para manter intactos os tabus e manter no alto os códigos de moral dessa mesma sociedade.”

Galeanadas à parte, o fato é que em meio aos sub-produtos: Eu, o ladrão, as moças vestidas de secretárias subservientes e fiéis, entendo mais o suposto algoz do que as leoas do sitema financeiro. Não se trata de discursos bestas fflchianos sobre a relação entre a desigualdade social e a violência e blablabla. Trata-se de identificação com a causas do outro, com o porquê do agir e atuar no mundo daquela forma. Eu tomaria uma cerveja com aquele sujeito, como já devo ter tomado por aí com figuras parecidas. Mas eu não tomaria nem um copo de água com açucar (arght) com aquelas vacas. Sente-se ou não se sente, não é? Pois bem, sinto compaixão e não tenho raiva do figura. Sinto ódio e chutaria aquelas cabecinhas medíocres do banco. Além disso, ele foi o único a tentar me tranquilizar, só ele me garantiu que o banco me ressarciria, com mais segurança do que as funcionárias. E de fato, nada como lidar com profissionais, o banco realmente me pagou o dinheiro. O capital circulou, movimentou a economia de algum lugar e eu fui apenas a mediadora desse processo.
No entanto, não procuro vitimizar ou glorificar a quem a vida e as escolhas colocaram do outro lado do mundo moral – burguês - capitalista. Mas quando penso nele, penso em sua redenção. Torço para que aquele dinheiro, o dinheiro que redime as putas com dor nas ancas e no útero depois de um dia de trabalho, também o redima da vida que leva, que tenha compensado. Como não saberei nunca a que serviu, prefiro pensar nas coisas como eu gostaria que elas fossem. Penso nele como um dos ladrões românticos criados pelo Mano Brow. Com uma corrente de ouro que poderia estar em um Setubal. Pagando cerveja e wisqui para os amigos no Carioca Club. Fazendo um churrasco no campão depois do futebol. O ladrão ligeiro, boa pinta, respeitado, principalmente profissionalmente, pelos seus. Como as putas que gozam. Eu prefiro assim.

“Encarnam a mesma imagem que o sistema forjou delas, para usá-las e depreciá-las; mas aí, atenção: esse auto-retrato é impresso em negativo, porque o objeto de desprezo passa a ser objeto de adoração; a abominação abre caminho para a devoção, e a prostituta decide que é sagrada. Achavam que eu fosse uma cadela? Pois sou uma deusa. Invulnerável:

À meia noite o cemitério se incendiou.
A mulher do diabo não morreu."
Eduardo Galeano - Crônicas Latino-Americanas

3.11.06

Essa é mais uma cena do espetáculo tragicômico mexicano: A vida andou passando a mão na minha bunda.


Hoje estou acreditando no sobrenatural, em zica séria. Já dei uma passadela na memória dos últimos dias, para ver se andei sacaneando alguém. Não... aparentemente ninguém puto comigo. Então deve ser mesmo a minha falta de fé. Só pode ser falta de deus no coração e ele tá me testando... Sacana, tentando me convencer a qualquer custo.

Seis da manhã. Gosto muito de dar aula em Mauá. São meus proletas favoritos. Mas às 6 da manhã não se pode gostar de nada. Café naquelas banquinhas na Paulista (por que comprar no comércio formal, se você pode comprar no informal que além de mais barato, é caseiro, portanto mais gostoso, e você contribui com a consolidação do lumpemproletariado?) Um moço que acabou de comer duas tapiocas e dois cafés por apenas 3 reais se emociona:
-Esse é o melhor país do mundo!
-É.
Sem
nenhuma convicção. Difícil tolerar um surto nacionalista na barraquinha de café. Mas também não quero contribuir com a amargura do mundo, portanto não consigo tratar ninguém mal antes das 10 da manhã. Além disso, já estava saindo. O figura insistiu no seu irritante otimismo...
-Um ótimo dia pra você.
Aí quebrou minhas pernas. Tive que sorrir e desejar um bom dia para ele também. Quem era eu para contestá-lo?
Me fez bem, fiquei até mais contente. Muito bem, vamos lá. Passar no banco pegar dinheiro, dar aula, iluminismo, ih, comprar ração pro bichos, Revolução Francesa....
- Mocinha, encosta no outro caixa.
-Ahn?
- Melhor você ir pro outro caixa senão vai ficar pequeno pro teu lado.
Mudei de caixa. O cara armado.
- Saque o dinheiro.
Explosão. Fúria.
-Puta que o pariu, eu não acredito que você vai me roubar. Eu não tenho dinheiro, se tá ligado que você vai sacar meu limite de crédito, né? Se tá ligado que a essa hora na rua com cara de sono só tem trabalhador, né? Porra, vai se danar, vai roubar de quem tem grana, vai roubar de quem não tem? Não sou eu que tenho culpa.
- Fica calma, que não vai acontecer nada com você.
-Acontecer o quê? Eu não estou com medo de você. Eu estou com muita raiva . Olha aqui o saldo da minha conta. Tá vendo. Menos 32,00. Já tá negativo. Se entendeu que você tá roubando um dinheiro que eu não tenho? Que você tá roubando da pessoa errada?
-Fica calma, o banco vai te ressarcir.
-Não, não vai. Pega logo porra.
-Fica na miúda aí que tem outro cara me esperando lá fora.
-Vai se danar.
Desabei a chorar. Em 15 dias, saldo a menos: Um roubo, sendo itens roubados: Um computador, vale dizer que com meu projeto que seria entregue em dois dias, nele, e uma câmera fotográfica que mal tive tempo de aprender a mexer decentemente. Uma paixão perdida, e um assalto a mão armada. Alô, alguém tá tirando sarro da minha cara? São vocês produção? Prometo que não chego mais atrasada....
Choro continuamente. Para finalizar o quadro, estou de tpm. Tá difícil. Delegacia, B.O.
Mais fúria.
- Nome? Idade? Estado civil? Profissão? Características do assaltante?
- Cássia, 24, solteira, professora, para quê? O que você quer que eu fale? Negro, alto, cabelo crespo, e tinha entre 25 e 30 anos? Ou pardo, baixinho, com cara de nordestino entre 20 e 25?
Ele não insistiu. Relevou, tudo bem, eu estava nervosa, tinha o direito de ser/estar histérica.
No ponto de ônibus, com cara de choro. Chega um sujeito, fudido, roupa suja, chinelo de dedo encardido e vendendo sei lá o quê no ônibus. Olha para minha cara de desespero com o mundo, e começa a cantar olhando para mim.
- Deixa a luz do céu entrar, deixa a luz do céu entrar. Abre bem as portas do seu coração. E deixa a luz do céu entrar... Com Jesus! Deixa a luz....
Assim, começando a ter um acesso de pânico com tudo, simplesmente o olhei com a maior cara de desprezo que consegui fazer naquele momento e dei uma leve rosnada.
Lição do dia: Aprendi como as pessoas se convertem, a qualquer religião. Os pregadores e desesperados só precisam se encontrar. É só uma questão de tempo e espaço. E com a proliferação desses iluminados por deus, concomitante ao processo de concentração de fudidos por metro quadrado, o espaço logo deixará de ser empecilho, porque eles estarão em todos. Seremos uma nação com Jesus.
Já eu, vou para casa me esconder e ler mais um romance que o mundo aqui fora não tá fácil não.
Fecham-se as cortinas – Fim do Primeiro Ato.

2.11.06

Ninguém para o mundo, e alguém para a gente

Mergulhar na gente. Dias em que não se fala com ninguém. Falo sozinha e uníssona durante toda a semana. Me exponho o tempo todo diante de pessoas. Sou professora de seres que me olham constantemente com um ar de, quem é você? Quem eles acham que eu sou? O que pensam quando me olham? Sinto-me sempre como uma aberração. Trabalho em um meio masculino. Sou a exceção. E detesto me sentir vanguarda de uma imbecilidade como a conquista de espaços femininos no mercado de trabalho. Conseguimos o direito de sermos exploradas em todas as esferas. Bela conquista....
Mas quando passo o dia mergulhada apenas em mim também me dá certa sensação de aberração. A vida é uma só, portanto não dá para fazer um rascunho e melhorar depois. Além disso, sou única (para meu azar ou sorte) e não posso fugir do que sou. Responsável por tudo o que diz respeito diretamente a mim. Sentindo coisas de uma forma que só eu sinto e entendo, vendo o mundo sob a ótica de um constante daltônico que não compartilha o senso comum. E dessa forma, quem compartilha? Quem me diz que existem apenas dois universos, o dos normais e dos daltônicos? Quem garante que essas duas categorias dão conta que resumir a percepção das cores?
Assim, mesmo partindo do pressuposto que cada ser é um universo, mesmo quando distante dos olhos cotidianos que me estranham tentando captar minha subjetividade, eu me sinto estranha. Bizarra não no âmbito do inaceitável, mas daquilo que saiu da trajetória comum para aqueles que a percebem. Quando a estranheza de não me sentir daqui e nem de lugar nenhum bate, saio para andar e tomar uma cerveja sozinha. Saio para tentar perceber o mundo e sua estranhezas, e dessa forma, percebendo o estranho para o meu olhar, sinto - me parte do mundo, me integro.
Entretanto, trata-se de um exercício doloroso. Voltar-se demais para si é sempre muito doloroso. Sugere um egoísmo que só pode ser maléfico, mas que ás vezes coloca-se como necessário. Mas se me isolo, é para ver com atenção o outro. E entender o outro é também entender a si mesmo na medida em que dividimos as mesmas esquizofrenias do mundo, e reagimos de formas peculiares e padrões frente a elas. As formas padrões dizem respeito, por exemplo, a coerção do mundo do trabalho. Muita gente faz a mesma coisa ao mesmo tempo e está aí o trânsito que não me deixa mentir. Mas muita gente, quando sai desse universo, faz muita coisa dita esquisita também, no seu pequeno mundo, na sua micro esfera de relações.
Hoje, essas pequenas doideiras do mundo me saltaram aos olhos num curto espaço de tempo, na verdade o tempo de andar da minha casa até um bar. Na verdade, antes ia ao cinema. No ponto de ônibus, sozinha. Então, surge uma figura... completamente bêbada, falando sozinha, dialogando com coisas que só ela estava vendo. Falando despropósitos e eu, aparentemente, não existia naquele recorte de espaço-tempo em que ela estava. Passa uma evangélica padrão, do tipo cabelo muito comprido preso num rabo de cavalo com uma presilha de pérolas falsas e saião. Passa e começa a cantar músicas do seu culto quando tromba a figura bêbada (que nessa altura fazia sinal para um ônibus que só existia no seu universo paralelo. Ou será que eu e a crente é que não víamos o real? Quem tinha razão naquele ponto?)
A figura veio na minha direção. Medinho....
-Eu mexi com você?
- Não.
- Eu mexi com ela? Olha lá....
E a saiuda cantando hinos ao senhor.... continuou, olhava para trás e realmente demonstrava sua repreensão e desprezo para com a sua próxima, aquela de quem acabara de ouvir falar na Igreja.
Por fim um fusca azul calcinha parou e levou a breaca. Nessa hora, enquanto ela fazia um ar de acolhida, só conseguia me ver como sozinha. Tive raiva da crente e de mim. Parecíamos as mais infelizes da história. A supostamente desencaixada, tinha alguém que lhe buscasse. Ali, eu não tinha nada, e a crente tinha a sua fé. Dane-se o cinema....
Cerveja no bar vazio. Fiquei pensando o quanto as pessoas que por ali passavam achavam no mínimo esquisito o que para mim varia de indiferente a um grande prazer. Só não assumo que gosto de beber sozinha porque tenho medo da implacável genética que me vem a cabeça quando escuto a história de meu avô, tios e primos. Portanto, faço apenas quando me sinto mal o suficiente para não me importar. Gosto de ir para o boteco beber sozinha e ler, ou observar pessoas. Fiquei pensando o quanto eu, que acho que dou conta da vida apesar das tristezas, devo parecer uma louca aos olhos dos outros. Da mesma forma que achava a bêbada esquisita, da mesma forma que estranhei uma conversa no orelhão ali do lado, de um pai que aconselhava o filho a vir para São Paulo trabalhar, da mesma forma como estranhei ver um casal de aparentes dóceis velhinhos urrando um com o outro dentro do carro. Ufa.... preciso perceber a tudo para achar que está tudo bem. Para achar que dentro do possível, por mais que eu não esteja nos padrões de uma moça meiga e fofa, está tudo bem. Dessa forma, olhar o mundo, pelo menos para mim, é uma das boas formas de olhar e aceitar a si. Não de um jeito simplesmente resignado, mas perdoando-se. Perdoando-se por também, às vezes, não conseguir, fracassar. Querer muito construir algo mas não ir adiante e acabar voltando não um, mas 25 passos para trás sem avançar nenhum. Acontece. Também não é tão precioso assim. Talvez banalizar um pouco. Não consegui e preciso pensar sobre isso.Vivemos em um mundo de pessoas que não conseguiram. Solidarizar-se com o outro, é solidarizar-se conosco. E com todos aqueles que sofrem pelos vieses desse mundo completamente torto. Não se trata de mérito. Mas de consolo. Da impressão de que, dentro do possível, está todo mundo sempre tentando fazer o melhor que dá.

30.10.06

O que é o que é??

Clara e salgada,
cabe em um olho e pesa uma tonelada,
tem sabor de mar,
pode ser discreta,
inquilina da dor,
morada predileta.,
na calada ela vem,
refém da vingança,
irmã do desespero,
rival da esperança,
pode ser causada por vermes e mundanas
ou pelo espinho da flor,
cruel que vc ama,
amante do drama,
vem pra minha cama,
por querer, sem me perguntar me fez sofrer,
e eu que me julguei forte,
e eu que me senti,
serei um fraco,
quando outras delas vir,
se o barato é louco e o processo é lento,
no momento,
deixa eu caminhar contra o vento,
do que adianta eu ser durão e o coração ser vulnerável,
o vento não, ele é suave, mas é frio e implacável
(é quente) borrou a letra triste do poeta,
(só) correu no rosto pardo do profeta.
Verme sai da reta,
a lágrima de um homem vai cair,
esse é o seu B.O. pra eternidade (...)
Jesus chorou - Racionais

Se por um instante, a realidade construída parece estar ficando (parecendo?) ao nosso gosto, numa brusca derrapada, parece que todo o controle sobre a vida se esvai em um simples não saber o que fazer. Nesse instante de ternura, quando algo (ou alguém) parecia estar incluído no nosso universo emocional, por um descuido, ou pelo zelo excessivo de tentar manter o belo, submergimos sem muitas vezes deixar uma âncora para nos lembrarmos aonde estávamos antes daquilo. Daí então a dificuldade de voltar. O barco, sem a âncora, ficou à deriva e se foi. E agora, ou procuramos retomá-lo, encontrá-lo na imensidão das águas (o que me parece um tanto quanto insensato, ou melhor, improvável), ou tentamos voltar para a margem e começar de novo, com outro barco, dessa vez com sinalizadores e meia dúzia de âncoras.

Enquanto conversávamos, mesmo com os olhos marejados, o esforço era tentar (repito, insensatamente), primeiro olhar o mais longe possível, procurando o barco. Depois olhar apenas para uma direção procurando a margem. Hora de voltar, de começar de novo, de não esquecer a âncora.
Não acho o barco, mas abro mais uma cerveja que por hora serve de bóia (apesar de serem aquelas de bracinho que não suportam nosso peso, e estou mais pesada do que nunca). Quase ficando bêbada, quase perdendo a dignidade, quase chorando.....
-Vamos pegar suas coisas lá em casa.... seu presente é seu. Não comprei para mim, não quero, ele vai sempre me lembrar que era seu e que se continua meu, não foi por opção.....
- Vamos.
Final quixotesco.... Caminhamos juntos, esfriava. Pegamos tudo. Voltamos. Eu te ajudava a trazer as coisas num último gesto de companheirismo, aproveitando aquele segundo em que ainda podia te ajudar em algo. E ainda procurava o barco.
Acho que gostou do que escolhi para a sua casa, aquela que eu não frequentaria.
Agora chega, levanto-me e digo que vou embora. Você me acompanha. O último beijo e simplesmente dizemos: Nos vemos.
É, ainda por um tempo, sei que te verei na minha frente. Enquanto ainda procurar o barco, só verei você. Cada vez que tentar entender e deduzir coisas que nunca saberei, como a direção do vento naquele instante, o que pode ter acontecido e para onde o barco pode ter navegado, só verei você.

Viro as costas, lembro que, ainda bem, não tenho mais dinheiro e não posso entrar no bar de novo.
Agora caía uma garoa que arrefecia a cabeça e o coração que ardiam. Paro de olhar para o horizonte e me volto para onde quebram as ondas. Não posso mais retornar para o ponto em que o barco, mesmo navegando sozinho, parecia estável. Portanto, busco a margem, respiro fundo, e torço para que meus braços aguentem chegar até lá. De novo. E quantas vezes precisar voltar.

27.10.06

CPTM II

Hoje o dia estava mais cinza....
Estranha sensação de não fazer parte desse mundo
Parecia que andava sobre tudo, a parte de tudo
Leve, não vendo nada, não sentindo nada
Tudo era alheio, uniforme e sem vida
A CPTM só desembarcava um rebanho,
não tinham humanidade,
não eram pessoas
hoje não sou uma pessoa, apenas existo apesar disso
apesar de tudo
E os casais se foram....
Ou não consegui enxerga-los?

23.10.06

CPTM

No trem da CPTM, os casais se amam
Ainda é cedo, o frio pega
e o trem apita
Avisos do mundo proibem o cigarro
Do jeito que as coisas vão
Um dia ainda irão proibir o amor
Mas os casais resitirão
Como os fumantes que se
acocorutam no cantinho da estação
É o ponto de encontro
entre Rio Grande da Serra e o Tucuruvi
Entre o trabalho mal pago,
a caçhaça e a roupa barata
Na luz do mundo inerte
o amor e os casais resistirão
Eles precisam resistir
Eles precisam existir
Por nós, por todos a quem o coração
transborda logo cedo na estação
Eles precisam lembrar a todos
que a vida é mais do que o sono
e o choro contínuo da raiva matinal
De quem nunca escolheu muita coisa
De quem carrega a marmita de um lado
e a vontade de outra
De quem carrega a dor contida
dos amantes no adeus
De quem só quer que o tempo passe
e o abraço e o cheiro de outrora voltem
E que só quer voltar para o trem,
de onde ele te trouxe
angustiado para onde ele te leva.
Devolvendo o que de manhã, a vida,
o trabalho e o trem lhe roubaram.

16.10.06

Historinha de uma história

Eu, cervejinha, amigas
Quando distraída,
no azulzinho do ônibus Vila Gomes
no canto, um olhar
que um dia, já quis que fosse meu
só para mim
era o seu, meio menino
meio moço sério
Fiquei com vontade de rir
meio bebâda, meio jogada
achando mentira o que para todo mundo,
dizia a lenda, existia
Historinha bonita....
que me deixa rindo sóbrea, sozinha
Ora bilhar, ora violão, ora cama, ora cerveja na Igreja
Você me chamando de maluquinha
e eu não querendo nada, só amada
E se assim coragem eu tivesse
só diria
E aí menino, quer escrever a quatro mãos
o que até agora construi sozinha
E então mocinho, quer continuar comigo,
essa que podia ser a nossa historinha?

11.9.06

Piedade II


Passei três dias seguidos em Piedade. Há muito tempo eu não fazia isso. Muita coisa perdeu o sentido de alguns anos para cá, não me reconheço e chego a esquecer que morei 18 anos naquele lugar, minha única referência de mundo até então. Tentei me integrar, eu tinha vivido tudo aquilo, não era possível não sentir-lembrar. Mas o que faz o lugar são as pessoas, porque o resto sempre muda... as pessoas também mudam, mas mudavamos juntas. No limite de tudo, os bares sempre mudam. A Casa da Cultura não é mais aquela onde passei as angústias, descobertas e amarguras da adolescência. Foi reformada, tomada pela prefeitura e agora mais parece um clube de mães que passam a vida pintando guardanapos. O teatro, a música, nossas bebedeiras se foram. Não tínhamos quase nada, tudo meio despencava, os cupins almoçavam cotidianamente nosso palco e o dinheiro era sempre muito curto. Mas tínhamos a chave da casa, um grupo de companheiros (um tanto quanto fechados, é fato, mas funcionava pra gente), um texto,um palco, música.... e vinho XV de novembro (carcanhá de grilo, carchera de fósfro, 10 + 5 é quinze, já que tá que fique...XVXVXVXV! Esse é mais ou menos o hino do glorioso XV de Piracicaba, sempre reverenciado após algumas garrafas) e Derby solto vendido no bar do Paulo por módicos 0,10 centavos cada.
Saudades de Piedade.... daquela que a maioria de nós abandonou. Nós crescemos e ela ficou apertada. Nós fomos embora e ela se modernizou. Mas, me perdoem o talvez excessivo conservadorismo, não consigo enxergar que as coisas melhoraram. Um mercado grande com açougue, padaria e quitanda que faliu todos os pequenos comerciantes e uma Casa da Cultura reformada,linda, moribunda e quieta, a meu ver e tendo minha memória como critério, não são exatamente sinais de progresso...

26.8.06

Piedade I


Piedade- Vila Élvio – lugar onde minha mãe nasceu. Uma Vila operária no meio do nada com lugar nenhum. Antiga exploração de madeira do mato para carvão. Depois fábrica de cama patente. Uma antiga fazenda de nome Vila Élvio em homenagem ao filho do dono que morreu quando caiu do cavalo. Meu avô morava no mato também. Vida miserável e minha vó fugiu dele quando ficou sabendo que tinha emprego na fábrica. Chegou na casa do compadre Simplício, que a acolheu com minha tia, e ainda permitiu que com seu nome fiassem para minha vó na venda, para as primeiras despesas. Depois de empregada, já trabalhando, convenceu meu avô a ir também... conseguiram uma casa na Vila, e em pouco tempo, como ele sabia escrever e fazer conta porque aprendeu com um primo sabido, tornou-se o encarregado. Fazia hora extra feito um doido, conseguiu acumular. Minha vó lembra quando chegou a “ïtalianada” como ela diz. Inclusive o dono da Vila e da fábrica era um italiano. Aquilo virou literalmente um samba do crioulo doido. Antes dos italianos, vieram também japoneses e os mateiros como eles. Misturou tudo, no melhor sentido do que é o Brasil e virou o lugar mais animado de Piedade. As pessoas iam para lá no Carnaval e nos bailes animadíssimos dos italianos com saudades da terrinha. Também foram eles que trouxeram um projetor, o primeiro cinema de Piedade. De uns tempos para cá, a Vila passou a abrigar também o “Vale das Hortências”, hospital psiquiátrico. Mais Brasil ainda.
Às vezes vou para lá comer pão assado na hora e ver os remanescentes italianos amigos da minha vó, como a dona Ana que criou minha mãe enquanto a mãe dela trabalhava. E viajar nas histórias do proletariado caipira -lombardo que esse Luis Livio, dono da fábrica conseguiu inventar. As evidências ainda estão lá, a fábrica, a casa onde minha mãe nasceu, o antigo cinema, o salão de baile. Meus avós vieram embora para a cidade e montaram um bar. Mas toda a memória ainda está lá, principalmente da dureza da vida, da solidariedade, das festas, como a de Santa Therezinha que deu nome a minha mãe. Todos contam de tudo, lutando para que aquilo não se perca. Mas a principal lembrança que permeia as histórias de todos, é dos carnavais. Dos bailes e das bebedeiras lembradas com um risinho que denuncia a moral cristã. Por que tem essa. Brasil que é Brasil faz festa, esbórnia, se embriaga na ânsia da alegria que compensa a vida. Mas como diz minha vozinha.... Naquele tempo não era o que é hoje não...ninguém respeita mais nada. A gente se esbaldava, mas respeitava. Terça-feira, meia noite acabava tudo e daí, festa só depois da quaresma. Não pode fazer festa quando o diabo tá solto porque ele atenta...
Quando ela fala disso, só consigo lembrar de outra música que nada tem de carnaval. Bom devia ser quando o diabo só estava solto nos quarenta dias da quaresma...

“Jesus está por vir, mas o diabo já está aqui.”

18.8.06

Tudo que é imaginado tem, existe e é - Estamira

Companheira Lioca e eu. Cinema. Estamira é o documentário da noite. Realmente bem bacana. É a história de uma mulher que trabalha em um lixão no Rio de Janeiro, e é enquadrada como esquizofrênica. No entanto, é a voz mais lúcida de todas....
"Os esperto ao contrário" é um dos termos que ela criou para tentar explicar esse mundo doido. Agora, o que mais ela ficava brava, e mais incomodava as pessoas a sua volta, era quando se falava de Deus...

Deus? deus é o caralho! Esse deus aí que vocês falam? Enfia no cú esse deus.... tanta gente não tira deus da boca, e aí, acaba miséria? Acaba gente sofrendo? Esse deus ladrão, estrupador,safado....

É mais ou menos por aí a conversa...claro que saimos com aquele mau estar por tudo... pela tenuidade entre o controle e a loucura, pela miséria daquela bosta de lixão, pela humanidade e coerência de Estamira, pelo espaço e pela vontade louca de não fazer parte daquele mundinho estúpido que paga para ir no cinema ver pobre, achando que com isso não é tão alienado quanto quem só vê Xuxa e os duendes...
A questão é quantas vezes não dá vontade de fazer igual a ela...
Sabe ter a sensação de que te tratam como louco? Se não, experimente falar mal de Ong's em espaços supostamente intelectualizados. Será tão difícil perceber que é mais uma prática neoliberal de contenção e não um caminho viável? Que é uma puta indústria nojenta que sustenta gente ganhando dinheiro com a desgraça alheia? Que é socialmente bonito e economicamente dedutível do imposto de renda, por isso pegou tão bem? Que é uma nova religião que suporta hippismos (deus é a natureza, a energia das pessoas, saca?)e ateus?
Enfim, salvo em meio a alguns companheiros de esquizofrênia, falar mal de ong é encarnar o diabo...Como assim você não quer o bem? Fazer o bem e ganhar bem com isso?
Fecho com a Estamira.
Para a puta que pariu... Deus e as Ong's!

16.8.06

Um por todos

Dia desses, me entupindo de café na sala dos professores sionista que frequento, olhando as coisas de sempre, jornais, revistas, bobagens, cronogramas de aula, dei de cara com os seguintes escritos sobre o sofá... Um por todos. E eis que descubro um poeta via professores de portugues desorganizados. Um por todos é o nome do livro de José Paulo Paes... vai ver que muita gente já conhece... mas eu nunca tinha visto e adorei. E também, aproveito para deixar o Manuel Bandeira em paz e não encher a meia dúzia de fiéis leitores. A Frida e o Che andam dizendo que estou repetitiva, a Aline não fala mais sobre o assunto e o Bola anda entretido com as comemorações do blog de um pessoal que mora lá na casa dele....

Poema circense

Atirei meu coração às areias do circo como se atira ao mar uma âncora aflita. Ninguem bateu palmas. O trapezista sorriu, o leão farejou-me desdenhosamente, o palhaço zombou de minha sombra fatidica


Só a pequena bailarina compreendeu. Em suas mãos de opala, meu coração refletia
as nuvens de outono, os jogos de infância, as vozes populares.

Depois de muitas quedas, aprendi. Sei agora vestir, com razoável destreza, os risos da hiena, a frágil polidez dos elefantes, a elegância marinha dos corcéis.

Todavia, quando as luzes se apagam, readquiro antigos poderes e vôo. Vôo para um mundo sem espelhos falsos, onde não há aplausos, porque tudo é justo, porque tudo é bom.



Madrigal

Meu amor é simples, Dora,
Como a água e o pão
Como o céu refletido
Nas púpilas de um cão


Drummoniana

Quando as amantes e o amigo
te transformarem num trapo,
faça um poema
faça um poema, Joaquim!

13.8.06

Fúria - O bilhar


Impressionante o poder do jogo... limpa a cabeça, pelo menos no momento da tacada. Concentra, te faz pensar só naquele instante, e ainda permite que se desconte a raiva empossada dentro da gente. Principalmente quando é raiva da gente mesmo. Ontem ganhei duas seguidas e raramente consigo tal façanha, mas a necessidade de pensar em algo que não fosse o meu umbigo, empurrava o jogo. Umas bolas bonitas que nem eu não sei de onde estavam vindo, mas vinham. Quando a cabeça voltava a caraminholar besteiras, a lembrar de frases como "Voce não tem nada de interessante" e a garganta embolava na solidão, no nó de se sentir muito só, na vontade de não ser tão auto-suficiente assim.... pronto, já vinha o famoso "sua vez", e lá se ia o pensamento para as estratégias da mesa. E acertar trazia a sensação confortante de que pelo menos alguma coisa estava dando certo naquele dia que, apesar de muito coletivo e festivo, tão para todo mundo, só me trouxe sentimentos ruins e egoístas. Não consegui me alegrar no coletivo. Ontem só me encontrei no jogo e na bebida, de verdade. Sorte no jogo.... já viu, né?

10.8.06

Voltou o trabalho.. e além de toda falta de sentido do negócio em si, ainda falta tempo pra fazer as coisas mais gostosas como escrever coisinhas e pensar sobre a vida.Quando se percebe, a máquina mundo já te engoliu tanto que a gente se esquece por momentos do que gosta... falta tempo para alimentar o gosto e reviver para lembrar... os prazeres também requerem prática, caso contrário acabamos só lembrando da amargura...Essa é a merda ... no mundo, tem muito mais gente praticando a amargura em detrimento do gostar de fazer. Fazer coisas, construir efetivamente o mundo e não ser construído por ele, moldado das formas mais variadas, do burga (como forma de reproduzir a situação, e não apenas em quantidade de grana), passando pelo trabalhador desgraçado até os comerciantes do PCC e suas variantes e associados menores. Gente infeliz para todo o lado, com a diferença de que obviamente é mais fácil tudo isso tomando conhaque Luis XVI no lugar de cachaça metanol....

A Estrela da Manhã
Eu quero a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã
Ela desapareceu ia nua
Desapareceu com quem?
Procurem por toda a parte
Digam que sou um homem sem orgulho
Um homem que aceita tudo
Que me importa? Eu quero a estrela da manhã
Três dias e três noites
Fui assassino e suicida
Ladrão, pulha, falsário
Virgem mal-sexuada
Atribuladora dos aflitos
Girafa de duas cabeças
Pecai por todos pecai com todos
Pecai com os malandros
Pecai com os sargentos
Pecai com os fuzileiros navais
Pecai de todas as maneiras
Com os gregos e com os troianos
Com o padre e com o sacristão
Com o leproso de Pouso Alto
Depois comigo
Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas
comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples
Que tu desfalecerás
Procurem por toda parte
Pura ou degradada até a última baixeza
eu quero a estrela da manhã
Manuel Bandeira

29.7.06

Sábado meio torto, morno, briguento e birrento. As pessoas são cada dia mais complicadas, obviamente, eu inclusive e principalmente. As relações se estreitam ou se distanciam de vez. A cordialidade de pessoas que apenas se relacionam pelo histórico. Sinto-me distante delas, séculos. Nossa história não andou junto, a vida não é linear. Agora, como dói quando assumimos isso.... Como é triste as pequenas declarações não declaradas de que as coisas só tendem a ficar mais distantes. Que talvez precisemos nos distanciar mais do que já estamos pela vida, pra tentar doer menos. Acho que não gostamos do jeito que somos. E por tabela detestamos a forma como nos relacionamos... Será? Ou eu estou sendo pretensiosa o suficiente para supor que você realmente, depois do choro ao telefone, parou para refletir sobre isso? Será que acaba com o seu dia tanto quanto o meu, ou é protocolar? Choro pelo papel que cumpre. Não quero magoar, mas também não quero me agredir. Será que você me enxerga um pouco próximo disso? Ou é mais cômodo ser a vítima de uma alma cruel? Tantas possibilidades, tantas dúvidas... e eu, tão desgastada pelo telefonema da manhã que por hora, não tenho disposição nem vontade para perguntar.

20.7.06

Quando tudo faz sentido...

Caminho, 3km segundo alguns. Uma turminha... eu, Julia, Tripa e Nildo, desde Jordanésia. Dona Ana e Dona Josefa desde o ônibus. Dona Josefa lembrou de mim, mas não sabe exatamente de onde. Ela me conta isso depois, no momento, só sorri em minha direção. Talvez para mim. Percebi depois que era para o mundo.
A chegada, as pessoas,o inesperado, tudo acontecendo ao mesmo tempo agora. Janta na casa de uma, dormida na casa de outra, e desfeita na casa de outra...ai se minha vó sabe disso. Jantamos com a Ediana.Dormimos na casa de D. Isabel. E no outro dia fomos almoçar na Dona Josefa, Zé Roberto, Chiquinho, Rafael e Rafaela, para tentar reparar a desfeita de ter sido convidada para jantar e não aceitar. Conversa, crianças, comida boa. Nós comemos nos pratos afinal éramos visitas. Com uma certa vergonha de ser tão bem recebida, com carne no almoço. Seu Zé me dá uma aula de escravidão no Pará me explicando o que ele passou. Trajeto: Ceará - falta de trabalho - Pará- escravidão e fuga – Ceará e Dona Josefa – São Paulo com crianças... 3 dias e 3 noites. - Você chega na horinha em que sai.... só que três dias depois...
E agora MST, se virando, morando, comendo, mandando os filhos para a escola. E ainda falta muito de tudo. As crianças tomando vitaminas em gotinhas. –Pra engordar tia – me explica Rafaela com a vitamina e a colher na mão....
O poço sendo construído por Zé Roberto – Vai ser cimentado e tudo-, Rafaela aprendendo a fazer roupinha de boneca com a mãe – Só não consegui fazer o colarinho- me conta Dona Josefa mostrando a roupinha vestindo o bebe de brinquedo. Rafael já sabe ler – Mas só com as letras separadas, as juntinhas eu ainda não consigo...- Chiquinho jogando damas de tampinha com João, o seminarista de Togo que está dando aulas de inglês no acampamento...todo mundo falando rauareiou o tempo todo.
Ainda faltam vitaminas e conforto..... mas já transborda a dignidade.

16.7.06

E depois faiz o quê?

Sentimentos misturados.... um pouquinho de medo de sentir algumas coisinhas. Conversando com um puta amigo no fim de semana, sabe aqueles que quando você fala determinados nomes e acontecimentos, sabe exatamente do que você está falando? Ele é ator...nos encontramos pouco então dificilmente a conversa não recai sobre o que estamos lendo, em que estamos pirando no momento e com quem andamos nos relacionando...ou não. Falávamos sobre o quanto, muitas vezes, somos profundamente conservadores quanto ao que esperar da vida e do amor. Ele me falava sobre um autor com o qual havia trabalhado em uma cena sua e que questionava justamente os modelos ideais, as idéias previamente elaboradas ou posteriormente explicadas do amor. Ficamos pensando como o amor acontece nas pequenas coisas..... naquelas que não explicamos, aquelas que o mito do amor romântico burguês sufocam e calam. Não existem tipos de gente pelos quais estamos passíveis a nos apaixonar. Essa loucurinha vem dos lugares mais estranhos travestidos nas mais diversas possibilidades.... Vem do nada, arrasa e toma tudo. Daí ser tão difícil de se situar depois, distinguir ou pensar nos porquês depois que sua visão já esta um tanto quanto ludibriada .... Inclusive, desconfio que nisso está toda a graça. Não explicar nada, só sentir tudo.

“Encontro pela vida milhões de corpos; desses milhões posso desejar centenas; mas dessas centenas, amo apenas um. O outro pelo qual estou apaixonado me designa a especialidade do meu desejo. Esta escolha, tão rigorosa que só retém o Único, estabelece, por assim dizer, a diferença entre a transferência analítica e a transferência amorosa; uma é universal, a outra é específica. Foram precisos muitos acasos, muitas coincidências surpreendentes (e talvez muitas procuras), para que eu encontre a Imagem que, entre mil, convém ao meu desejo. Eis o grande enigma do qual nunca terei a solução: por que desejo esse? Por que o desejo por tanto tempo, languidamente? É ele inteiro que desejo (uma silhueta, uma forma, uma aparência)? Ou apenas uma parte desse corpo? E, nesse caso, o que, nesse corpo amado, tem a tendência de fetiche em mim? Que porção, talvez incrivelmente pequena, que acidente? O corte de uma unha, um dente um pouquinho quebrado obliquamente, uma mecha, uma maneira de fumar afastando os dedos para falar? De todos esses relevos do corpo tenho vontade de dizer que são adoráveis. Adorável quer dizer: este é o meu desejo, tanto que único: “É isso! Exatamente isso (que amo)!” No entanto, quanto mais experimento a especialidade do meu desejo, menos posso nomeá-la; à precisão do alvo corresponde um estremecimento do nome; o próprio do desejo não pode produzir um impróprio do enunciado: deste fracasso da linguagem, só resta um vestígio: a palavra “adorável” (a boa tradução de “adorável” seria ipse latino: é ele, ele mesmo em pessoa).”
Fragmentos de um discurso amoroso – Roland Barthes

13.7.06

madrigal tão engraçadinho

Teresa, você é a coisa mais bonita que eu vi até hoje na minha vida, inclusive
O porquinho-da-índia que me deram
quando eu tinha 6 anos.

Manuel Bandeira

11.7.06

Jirlene

Ji trabalha comigo. Na verdade Jirlene. Faxineira. Veio de Alagoas mocinha para trabalhar. Encontrou um traste, que antes de casar não era tão traste.
-Senão eu não tinha casado, não e?
-É.
Adorável namorado machista que se transforma em maldito marido machista. A posse quase de brincadeirinha, bonitinha, joguinhos de amor. Confirmada explicitamente, mudado o sobrenome, também a violência torna-se explícita. Os empurrões, as ameaças. O casamento não é mais uma opção de amor e realização social. É agora de pressão social e medo. Não podem largá-los Não os amam e não podem largá-los. E minha cabeça limitada pela minha condição, tem dificuldade de pular o muro.
-Mas você trabalha..... já disse que ele não dá nada nem para você e nem para sua filha....
-É, mas ele não sai de casa, diz que eu tenho outro.
- Sai você.
_ Tem a Greice....
- A Greice tem nove anos..... aos poucos ela entende....
- Ela diz que eu vou achar outro homem. Ela fala assim: Mãe, e se você achar outro homem, e ele mexer comigo?
Frio no estômago. Ela tem nove anos. De onde ela tirou essa idéia?
- Ji, presta atenção nela. De onde ela tirou isso? Você não acha que ela vai estar melhor só com você. Você mesmo disse que o traste é um inútil, peso morto, um estorvo para quem você é obrigada a lavar, passar e cozinhar.
- Eu tô vendo dois cômodos perto da minha irmã. Ia ser bom porque ela me ajuda, pode ficar com a Greice. O dinheiro que eu pago a moça onde a Greice fica, pode pagar quase inteiro o aluguel.
- A Greice fica na casa de outra pessoa? De quem? Tem homens lá?
Bateu o sinal. Ji sai correndo para limpar a lousa. Vou para sala de aula. Pensando na Greice. Linda, com um cabelo bem comprido, morena....Pensando coisas ruins. Vontade de chorar... e de ter grana para pagar o aluguel delas. De sentar e contar uma história para a Greice, triste, porém pedagógica. Torcer para que tudo seja só paranóia, que ela não entenda essa história. E que a dela seja mais bonita.

4.6.06

E começa outro ano....


Nunca me apeguei muito a datas festivas.... e nem sempre foi pela simples vontade de contrariar, ou pelos surtos adolescentes.... foi só falta de vontade mesmo. Nunca achei divertido, o dia continuava igual, a festa na praia era chatinha, abraçar parentes era quase uma violencia e se distanciar da familia dava tanto trabalho, que não valia a pena por uma data que nunca me disse nada.... nada além de que definitivamente as coisas não mudariam. Neste ano tudo ja começou mudando.... e eu pude dormir! Que absurdo dormir enquanto multidões abrem os braços para o ano novo cheia de esperanças e expectativas.... mas era isso o que eu queria projetar para o resto do ano no minimo. Fazer coisas por prazer e não para cumprir qualquer tipo de compromisso (com excessão da sobrevivência, que afinal, livre nesse mundo, não consigo nem imaginar alguem. Talvez o Seu Antonio, um senhor que fica sentado perto da minha rua, esperando a aposentadoria e fugindo dos filhos que querem transforma-lo em um velhinho que mora nos fundos... o morador de rua mais digno que já conheci). Quero dormir as 23:45 hs do dia 31 de dezembro se me der vontade. Quero não comemorar meu aniversário se me der vontade. E comer mortadela frita com cerveja. E me apaixonar ... não porque o mundo me faz uma cara de decepção quando digo não, mas porque quero buscar paixões em todos os cantos, em todos os lugares, e até naquela choradinha matinal do sonho ruim. Quero dormir no ano novo para ver o nascer do sol do 1º dia do ano, o que pode ser tão ou mais encantador. E sorrir com o samba. E chorar com o samba. E me embriagar como no samba. E sentir essa vida amortecida com falta de samba.