28.1.08

Mais uma...



Além da Terra e do Infinito
Eu procurava o céu e o inferno
Mas uma voz solene disse-me:
- "Procura-os dentro de ti mesmo"




Rubaiyat-
Omar Khayyam

22.1.08

Barbárie!

"O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado o terreno lembrou-se de dizer “isto é meu” e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: “evitai ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém”.

J.-J. Rousseau e o Discurso sobre a origem e
os fundamentos da desigualdade entre os homens.

21.1.08

Mulher moderna é o caralho!

Essa história de mulher moderna é realmente a coisa mais opressora que já inventaram em termos de categorização de comportamentos. Eu e minha lasanha congelada andamos conversando e discordando um pouco dessas idéinhas...
Ficamos realmente sem saber o que pensar: Ninguém tem saudade de quando tínhamos a possibilidade de, no máximo, ser uma boa esposa e mãe. Entretanto louvar as maravilhas de poder ser explorada pelo capitalismo é demais. Existe conquista na medida em que posso me prover como ser humano, mas essas conquistas são questionáveis quando penso em tudo o que perdi enquanto ser humano.

Se o padrão de mulher era aquela fofa, frágil e sentimental, hoje o padrão de mulher ideal, aquela que vai para a capa da Marie Claire (porque chique é ser inteligente) são as mulheres completas: Ou seja, na mesma edição temos moda, sexo, comportamento, trabalho e filhos. Folheando uma dessas, percebi que tenho bem poucos assuntos que me interessam naquela merda toda. Talvez a parte de sexo porque trazia um artigo sobre casas de swing... Ser liberal, pra frentex e frequentar putarias também tem que estar na lista da super mulher.

Portanto, essas revistas geralmente trazem moças bem vestidas, gostosas porém discretas, com filhos pendurados de um lado, uma maleta com ar de escritório do outro e na sua frente, um lindo automóvel com o porta malas aberto e cheio de compras... Uhuhuhuhu... Bela libertação.

E não sofrem por amor. Isso é coisa de mulher fraca. A moderna de verdade, compra uma roupa bonita e vai para a balada. Bem sucedida, linda e pagando sua conta. Chorar por homens é coisa de mulherzinha fracassada procurando renda para se encostar.
Bom, mas pelo menos agora podemos ter tesão e orgasmos. Toda vez. Sempre. Nada de estar cansada. Ou triste. E coitada daquela que não conseguir. A mulher moderna também TEM QUE TER PRAZER e ser um vulcão de sensualidade, colocar uma cinta liga e um disfarçador de olheiras pra tirar o ar de cansada. Senão querida, procura um analista ou vai perder o marido...

Bom, tudo isso foi uma onda de raiva que me veio junto com a lasanha congelada. Não sei fazer uma de verdade e não tenho muita vontade, para ser sincera.

Quando me vem o que deveria ser o meu mundo se eu fosse a mulher antenada que minha condição de classe permite, me dá uma preguiça da porra. Não quero ser tudo isso, obrigada.
Mas quando vejo as moças que não tem a minha condição de classe, trabalham pra cacete sem salário, vivem absolutamente imersas na dicotomia esposa- amante, e que até para tomar uma cerveja tem que pedir ordem e dinheiro para os maridos, que por sua vez, as deixam trancadas em casa e vão dar em cima de moças como eu no samba, me dá uma tristeza.

É o limbo de não ser nem uma nem outra. E se não te categorizam, ninguém acredita que você também é desse planeta.

Sei que a mulher moderna com conta bancária estaria em algum lugar descolado, sozinha (na ausência das amigas) e fazendo um ar de bem resolvida.
Mas hoje, eu e a lasanha estamos bem em casa, vendo novela. De mulherzinha.
Me obrigar a ser mais que isso, seria uma violência para com a minha canseira disso tudo.

Eu seria uma mulher moderna demais pra mim.

20.1.08

Sambando na jaca


Tendência


Dona Ivone Lara


 Fundo de Quintal & Doan Ivone Lara
Tom: C
Introdução: F7+ / F#° / A / A7 / D7 / G7 / A / G7 /


C Am7 D7
Não......pra que lamentar
Fm G7 C A7
Se o que aconteceu......era de esperar
Dm G7 Em A7
Se eu lhe dei a mão.....foi por me enganar
D7 Fm G7 C Am7
Foi sem entender, que o amor não pode ha.....ver
D7 Fm G7 C A7
Sem compreensão,a desunião......tende aparecer
Dm G7 Em A7
E aí está......o aconteceu
Dm G7 C
Você destruiu......o que era seu
G7
Veja só !
C
Você entreu na minha vida
E7
Usou e abusou, fez o que quis
A7 D7 C7
E agora se desespera, dizendo que é infeliz
F F#° C A#7 A7
Não foi surpresa pra mim, você começou pelo fim
D7 Fm G7
Não me comove o pranto de quem é ruim, e assim
C
Quem sabe essa mágoa passando
E7
Você venha se redimir
A7
Dos erros que tanto insistiu por prazer
D7 C7
Pra vingar-se de mim
F F#°
Diz que é carente de amor
C A#7 A7
Então você tem que mudar
D7 G7 A7
Se precisar, pode me procurar, procurar !
D7 G7 C
Se precisar, pode me procurar


Dias de cabeça funcionando pouco, estudos burocráticos, fígado
muito requisitado e saudades... Dias de cansar o corpo no samba,
sentir dor no pé na hora e na cabeça no outro dia. Não podemos sentir
duas dores ao mesmo tempo. Então a do coração se disfarça.

18.1.08

Minuto de sabedoria persa

Brincadeiras bestas... Abrir aleatoriamente um livro de sabedorias. Hoje não foi o Bandeira, mas os pensamentos de Omar Khayyam...

Nenhum poder sobre o destino
Te foi dado, sabes
Que adianta a ansiedade em que ficas
Pela incerteza do amanhã?

Então, se és um sábio, procura
Tirar do momento presente
O maior proveito possível.
O futuro o que te trará?

Rubaiyat

Salve, salve...
E depois a gente vê.

16.1.08

O sol voltou....



Os Pingo Da Chuva
- Os Novos Baianos

Quando o céu estiver preto e das nuvens até as sombras assombram. (bis)

É só o reflexo do que está acontecendo. Só está faltando fósforo. Me dê aí!

Não esqueça que nesse momento o vento sacode as árvores e o clima que fica e o ar agitado.

Dizendo tudo o que pode acontecer. Não escureça nem esquente a cabeça. Eu sei que você tem argumentos de querer.

O sol pra pegar sua praia, pra bater sua bola. E a lua pra ver sua mina, ou só pra ir ali na esquina.

Sem rima, sem rima!

Faça como eu que vou como estou, porque só o que pode acontecer...

É os pingo da chuva me molha, é os pingo da chuva me molha!
É os pingo da chuva me molha, é os pingo da chuva me molha!


15.1.08


Será que o amor é sempre um fardo? Bonito, mas sempre um fardo?
Fiquei um tempo olhando a imagem, enlouquecendo sozinha e pensando que talvez , mais fácil mesmo é assumir a solidão.
Só então olhei direito, e pude reparar que atrás do fardo, existe uma mão que ajuda a moça do primeiro plano a carregar o peso que paira sob suas costas.
Pensei então que o amor deveria ser isso: O companheirismo que deixa a vida menos pesada e dolorida.

14.1.08

Vivendo em um caixote

Impressionante como a noção de espaço foi completamente moldada pela necessidade de que muita gente more no mesmo lugar, nas rebarbas do capital, seguindo seu caminho e ritmo. Os escravos sempre acompanham...E essa doidera toda de capitalismo tosco tardio e meia boca, deixa os subdesenvolvidos a cada dia mais perdidos, fazendo mais e mais pataguadas querendo ser modernos. Enfim, coisas sem pé nem cabeça, arquitetura esquisita, e um bando de capiras morando em caixinhas empilhadas. Tipo eu na fase 1 do estágio: Como morar em apartamento.

Sinceramente, e é bem feio admitir, mas com relação a espaço, tenho um raciocínio em favor do senso aristocrático. Ora, na minha terra, o poder ainda tem relação territorial e não apenas virtual e financeiro. Gente rica mora em casas grandes com enormes quintais e pronto. Fiquei realmente espantada quando entrei em um apartamento super harahara (segundo os daqui), 1 por andar e traus. Achei pequeno. Não entendi a graça de ter dinheiro aqui, se não se pode ter uma casa gigante, isolada, piscina, escravos servindo suas mínimas vontades por todos os lados. Não é assim?
Pois bem, os ricos do dito capitalismo emergente são medíocres como todo burguês emergente. Acham o máximo morar em um apartamento no Morumbi, por exemplo. E a classe média é infeliz pra caralho tentando seguir o padrão de vida... Hoje em dia, as pessoas senso-comum-zé povinho arregalam os olhos de pavor quando te ouvem dizer que sua moradia é uma casa.
Enfim, mas aqui no estágio de apartamento, rolaram algumas engraçadas. Com a cqs e agora sem ela.
Cena 1
Eu chego. Uma lata de cerveja na mão, outras algumas na sacola. Esqueci de novo o número do apartamento. O porteiro me diz que é o 43. Quando estou entrando, ele, o porteiro protestante me intercepta:
-Olha mocinha, vou ter que pedir para você terminar essa cerveja lá fora. Não pode entrar bebendo coisas alcólicas no prédio.
Eu, como um olhar de vítima e ar de inocente, bebendo na rua em uma terça-feira lá pelas duas da tarde.
-Mas eu acabei de abrir. Está cheia, gelada.
Um porteiro protestante é incapaz de se sensibilizar com esse tipo de apelo.
-Mas não pode. A senhora termina e sobe.
-Mas daí as outras esquentam, é para a minha amiga... Olha, e se eu colocar aqui no cantinho da sacola, de pé apoiada nas outras, aberta mas escondidinha, tudo bem?
-Tuuuddooo bem.
-Certo.
A essa altura eu já estava rindo na cara do sujeito. Vai bater?

E outra hoje. Cena 2.
Esperando a Sandra, moça da faxina. Acordei mais cedo com medo de não escutar o interfone. Ele toca.
- Oi, é a Sandra, abre para mim.
-Claro, pode deixar.
Desligo, vou até a porta. Viro a chave.
Ela toca de novo.
-Então, você pode abrir para mim?
-Mas está aberta...
Ela desiste, desliga e em poucos minutos está na porta do ap., levemente inconformada.
-Viu, eu estava lá fora, era para abrir o portão porque estava sem porteiro. Fiquei um tempo lá, daí um velhinho abriu e eu entrei.
- Puts, desculpa Sandra, eu não estou acostumada com interfone.

Me senti uma anta de chapéu, claro. É isso aí. Logo, logo, mais uma caipira em um apartamento se atrapalhando. Aprender vá lá. Achar que é assim mesmo já é um pouco demais.

13.1.08

Moças e camas de casal

Domingo me parece um bom dia para devanear sobre besteiras absolutamente especulativas e sem nenhuma comprovação científica. Aproveito então para formalizar minha teoria baseada em observações de pouco alcance e no famigerado método noffs, ou seja, análises e generalizações baseadas em mim mesma. Acho que o título pode ser: " Moças sem marido com uma cama de casal. Uma faceta da mulher pós-moderna". Puts, acho que com um título desse ou algo assim, eu posso escrever qualquer merda dentro porque já venderia horrores na Livraria Cultura ou da Vila, por exemplo.

Poderia começar...

"Acordei e percebi que estava atravessada em posição diagonal sobre a minha cama, como há tempos não fazia. Naquele momento, percebi o espaço vazio que a pouco estava ocupado, e fiquei pensando o que significava aquela possibilidade, criada por mim e pelo meu tempo, de poder ocupar ou não um espaço que de qualquer forma é meu. Não me foi me dado por ninguém, muito menos por uma sombra de família e casamento que normalmente habita os quartos da sagrada e convencionada sociedade católica. Naquele quarto havia uma cama que sugeria um casal, mas que abrigava uma moça, e apenas eventualmente, um moço."



Eu me divertiria horrores. Mal saberiam os leitores da profundidade daquele momento, da cama antes ocupada e agora vazia: Fazia muitos e muitos dias que eu havia lavado uma quantidade astronômica de roupas que, depois de secas e recolhidas, passaram a habitar a metade da minha cama. Voltei a ter uma cama de solteira por puro esculacho. Mas isso foi em 2007, outra vida... Voltar a ter uma cama de casal foi o primeiro projeto já realizado em 2008.

Bom, penso que as moças sem marido e com uma cama de casal, constituem um grupo dentro do universo de mulheres diretamente beneficiado pela expansão do mercado de trabalho feminino mais ou menos qualificado e destinado ao nosso meio, a tal da classe média. Pagando suas contas, esse grupo conseguiu admitir que mulheres possuem sexualidade independente do fato de serem ou não casadas. Combatem o valor moral agregado ao tamanho da cama. Por exemplo um absurdo chamado cama de viúva, que não é nem estreita como a de solteiro e nem larga como a de casal. Ou seja, eu sei que você não é mais uma mocinha que sonha com seu amado em lençóis brancos do seu quarto que ainda preserva o ar infantil, mas também não venha me dar uma de putana e colocar um macho aí. E se colocar, tem que ser apertado, desconfortável já para não dormir. Ou alguém já viu uma cama de viúvo?

Não somos mais aquelas mocinhas que moram com os pais e ficam ansiosas para que o namorado possa, um dia desses, levá-las ao motel, a única possibilidade de transar tranquilamente, inclusive com o raro luxo de ter uma cama. E no caso de mulheres que já dividiram a cama, mas voltaram para seus latifúndios, este não representa apenas a marca de que ali já houve um casamento, nem passa a ser a cama de um dos filhos (obviamente não nos casos em que não existe outro lugar para um dos pequenos dormir, diga-se de passagem, o mais comum), e sim a cama de uma mulher que tem todo o direito de colocar seus namorados, quantos sua moralidade permitir e seu desejo chegar.

Claro que nem tudo são flores. Moças sem marido com uma cama de casal por vezes, acabam ficando um pouco egoístas e espaçosas. Um dos sintomas disso, é uma grande dificuldade em se adaptar à nova divisão do espaço propugnada obrigatoriamente por um relacionamento. Rola um inconformismo sincero quando se acorda com a cara na parede, observando os três palmos que lhe sobraram do seu latifúndio. Olha-se para o fulano ou fulana esparramado por todo o resto e só uma ternura profunda poderá ser o visto de permanência daquela pessoa que conseguiu se aboletar ali.

Entretanto a resistência para aí. Moças solteiras acostumadas com sua cama de casal também podem desacostumar, basta estarem dispostas ou não.No nosso entender a idéia de disposição, associa-se diretamente ao estar apaixonada. Entretanto, se vão querer dividir o espaço, saindo dessa forma da nossa categoria de estudo, não cabe às nossas especulações.

11.1.08

Sobrevivemos

Penso que todo mundo tem um pouco de sobrevivente da sua própria história. Nessa trajetória de acúmulos de experiências, ou seja, dores e alegrias, por mais que os momentos bons ou ruins passem, algo sempre fica com a gente. Vai nos moldando a existência e nossa forma de enxergar o mundo. O fato é que não é fácil para ninguém lidar com as próprias marcas, acho eu que, disso ninguém escapa.
O que vai sair disso, se pessoas ditas "normais" ou não, além de depender da referência do que é "normal", nem um caminho ou outro demonstra que se lidou bem com todas as informações e tragédias, seja do meio em que se nasceu, ou seja, a estrutura material e familiar, seja das escolhas proporcionadas por essa base que não foi por nós escolhida.
Portanto, parece que temos duas linhas que regem a vida: Uma que não escolhemos, que nos foi dado pela própria idéia de passar a existir em algum lugar e tempo. E outra linha regida por nós mesmos, por nossas escolhas, ainda que também profundamente condicionadas pelos pressupostos anteriores.
Bom, fiquei pensando nisso lendo "O Rio do meio" da moça que citei no post anterior. Tranquilo de verdade ninguém é. Mesmo aquele sujeito mais enquadrado, bestinha, que parece não ter cerébro a não ser um comprado em uma liquidação, também tem seus questionamentos e crises. Podem não ser as que considero mais profundas, mais isso é um critério meu, também criado a partir da minha vida.

Pois é, mas de verdade, apesar de saber que todos possuem um universo particular, me encantam os guerreiros. Acho que é porque tenho me sentido mais fraca do que de costume, mais suscetível, uma sobrevivente não tão digna, não tão esperta.
E admirando os guerreiros, tenho cada vez mais raiva de gente que anda com sua ferida exposta como se aquilo fosse o seu orgulho de existir e por isso, tivesse que ser desculpado por todos de todas as suas atitudes escrotas.
O sofrimento não é apenas o seu ser. É sua máscara. Sua justificativa para tudo.
Não sei se em todos os meios, mas tenho a impressão que no mundinho fflch, convivemos muito com gente louca para ser louca (citando a companheira Juju). Em geral são egoístas, acham que sua dor é maior do que a de todo mundo, são barriguinhas e desagrádáveis. Querem ser diferentes pelo sofrimento. E assim também se acham melhores. Pairam sobre uma humanidade, que consideram medíocre.
Por vezes também me sinto um pouco como esse tipo de gente. Mas penso nisso justamente porque não quero ser assim. A minha dor não pode me dar o direito de causar a dor no outro.
Me esforço. Tento não ser o que abomino. Aproveitar e aprender tudo o que der de situações quase surreais de tão absurdas e sem sentido.
A verdade é que desisti de entender.
Por hora, me contento em tentar não ser igual.

10.1.08

Convite

Lya Luft


Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.
Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha
da vida, sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou
mistério

A quatro mãos escrevemos este roteiro
para o palco de meu tempo:
o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério.


E no meio das trapalhadas e desventuras da vida, cultivar os pequenos gostinhos de viver, torna-se quase um alívio frente a tantos desencontros. Encontrar outros tipos de encontro.

Dentre esses prazeres que deixam a vida menos árida, encontrar gente bacana que escreve bem é um dos que mais me contentam. Mais uma dos queridos amigos que mesmo longe estão perto. Mais uma para lembrar o quanto as pessoas são bonitas e podem nos acrescentar na existência. Assim, me contaram dessa moça de cabelos já branquinhos chamada Lya Luft, contista, poetisa, romancista e sobretudo mulher. E agora, tenho um lindo romance para me fazer companhia por mais uns dias.


9.1.08

Aptidão

Segundo o dicionário, ter aptidão é ter disposição natural ou adquirida sobre qualquer coisa. Portanto, aptidão natural pode ser aquilo que mesmo sem estar manifestado, já existe naquela pessoa que a possui. Na verdade, não sei se acredito que existem coisas naturalmente incutidas nos seres, como se fosse um dom. Mas se existe, acho que por mais que nos esforcemos, podemos aprender, adquirir determinadas aptidões, mas talvez nunca sejamos tão bom naquilo da forma como o "naturalmente" apto é.
Não sei mesmo se existe a aptidão natural. A palavra me incomoda. Naturalmente, entre seres humanos, me lembra darwinismo social. Mas achar que todos temos a mesma facilidade com tudo, é homogeneizar o ser humano, desprezar talentos.

Fiquei pensando nisso porque conheci uma pessoa que me encantou profundamente. O encanto me tomou justamente porque perto dela, eu parecia uma amadora, uma pessoa sem aptidão para amar o outro e que, por mais que eu me esforçasse, por mais que adquira a aptidão, nunca terei aquela tranquilidade e desenvoltura de quem sabe que nasceu para amar, que não poderia ser de outro jeito.

Ela ama como quem respira. Ela abraça, beija, fala de amor com a mesma facilidade e docilidade de qualquer tarefa muito simples e elementar. Eu a observo e me deslumbro. Tenho vontade de chorar na sua frente porque sei que ela me consolaria com a mesma aptidão, me colocaria no colo e aninharia meus cabelos. Ela perceberia na mesma hora que isso me acalma. E não preciso ensiná-la. Ela sabe.


Esse ser que sabe amar lê o que escrevo por cima do meu ombro. Diz que escrevo bem. Seus elogios são tão sinceros que coro. Ela diz que já me conhecia antes de me conhecer, por outros meios, mas que tudo o que sabia era nada perto do que eu sou. Mas eu, tenho tanta angústia, saudade, tristeza e álcool dentro de mim, que só sei olhar para ela feito uma boba. Não digo nada. Não aspiro nada naquele momento.
Só me vem uma dor, uma pontada no peito de me saber incompetente. De saber que estou longe de tudo o que ela sabe e não ter certeza se sou capaz de aprender.


"Essa ferida, meu bem
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã."
C.D.A

3.1.08

Mais um ano...

Particularmente não gosto tanto assim de rituais de passagem. Nesse ano, quando chegou o dia 31, fiquei ouvindo todo mundo fazendo pedidos, falando que ano que vem tudo será diferente... Como acabo sendo sem querer aquele tipinho de gente que leva tudo ao pé da letra e não entende piada, esses comentários me soavam quase como ofensas ao bom senso.
Não, as coisas não vão ser diferentes, o mundo não vai mudar muito, e normalmente o que muda é pra pior. E provavelmente as coisas mais emocionantes do ano serão as eleições municipais.
Admito que estava rolando um mal humor. Comunidade caiçara que quer ser capitalista e não consegue, muita gente acampando, menstruação fora de hora em um lugar que vende apenas o básico do básico para a sobrevivência, tipo gelo e repelente... E tinha acabado o gelo.
Enfim, a chatice toda era por não entrar no clima de euforia que reinava na praia afastada, porém lotada. Fico sem graça, me sentindo meio estúpida pedindo coisas para o sobrenatural, até porque pensei, pensei e não consegui pensar em listinhas para Iemanjá. A paz mundial e o fim da fome me parece absurdo demais para uma entidade só...

Bom, no meio de tudo isso, um garoto se afogou na praia. Nunca tinha visto alguém morrendo na minha frente. Ainda mais um menino que não devia nem ter 20 anos, e de um jeito absolutamente do além, com o mar calmo e os amigos todos em volta. Mas ele sumiu e quando o acharam, o mar já tinha vencido.

Na hora das sete ondinhas, só pensava nas pessoas que o amavam. Ele já não me importava mais porque simplesmente não havia o que fazer. Mas naquela festa toda, eu tinha visto a cena que acabou com as expectativas de um ano feliz para uma mãe, um pai, uma namorada, e sei lá mais quem aquele menino podia ter na vida.

Bom, depois da bebedeira, da saudade imensa de algumas pessoas que me tomou no meio de toda a comoção de terminar a noite sentada na praia olhando para o mar, consegui finalmente pensar que tudo o que eu quero para esse ano, é não perder nenhuma das pessoas que eu amo e continuar a viver com elas, do jeito que todos nós somos.

O resto a gente ajeita. Só não se arruma o que o mar leva, ou no coração se parte. Enfim, só não tem mais jeito, se o amor não der... hehe